A literatura aponta que a gratidão é provocada após a pessoa experienciar uma situação de comportamento pró-social (que beneficia as outras pessoas ou a sociedade como um todo, como ajudar, compartilhar, doar, cooperar e se voluntariar) quando existe algum estímulo que os leve a avaliar os eventos de forma positiva. Entretanto, cabe questionar como a gratidão pode aparecer em contextos de risco ou de adversidade. Contextos onde existe o predomínio de situações e eventos estressantes, emoções negativas, comportamentos violentos, ausência de comportamentos pró-sociais e de supervisão efetiva de responsáveis. Será que o contexto de risco pode impedir o desenvolvimento da gratidão na vida das pessoas que vivem em situação adversa? Essa discussão tem promovido algumas reflexões sobre essas questões e atraído o interesse acadêmico.
Identificar os benefícios nas situações adversas pode influenciar o modo como a pessoa percebe sua vida. O fato de ajudar alguém também promove e produz emoções positivas.
Por exemplo, pessoas que oferecem ajuda, podem sentir orgulho dessa atitude e continuar experienciando bons sentimentos. Da mesma forma, pessoas que recebem ajuda podem se sentir agradecidas e desejarem recompensar os outros. Ainda, alguém que assiste ou presencia essas situações pode sentir emoções positivas. Eventos positivos e até mesmo os negativos e adversos podem provocar o aparecimento de emoções positivas e transformar pessoas e comunidades. Dessa forma, a gratidão pode ampliar a atenção dos indivíduos e inspirar ações positivas no futuro estabelecendo, assim, uma cadeia de eventos e promovendo organizações mais harmoniosas e coerentes.
Eventos estressantes estão presentes no cotidiano de todos os seres humanos. Difere, no entanto, a forma como cada pessoa lida com esses momentos. As emoções positivas podem funcionar como fator de proteção nas situações adversas e consideradas de risco, promovendo resultados saudáveis e conseqüentemente, afetando os processos envolvidos na resiliência.
A partir de uma outra perspectiva, é intrigante refletir sobre a possibilidade do contexto de risco enrijecer a possibilidade de experienciar a gratidão. Por exemplo, se um indivíduo não perceber nenhum aspecto positivo em sua vida diária e não cultivar emoções positivas, como poderá apresentar qualquer disposição para experiências positivas e que envolvam gratidão? Esse fato é bastante comum nas populações que vivem em situação de risco cotidiano.
Os fatores de riscos e os estressores são visíveis, reconhecidos e investigados constantemente, bem como a gravidade e a amplitude das conseqüências sociais que envolvem essa população. A própria situação de adversidade que vivenciam propõe um conjunto de experiências relacionadas às privações de ordem afetiva, cultural e socioeconômica que desfavorece o pleno desenvolvimento biopsicossocial. No entanto, essas condições não podem ser assumidas como únicas e estáticas, uma vez que existem outros fatores envolvidos no desenvolvimento humano que merecem consideração (Luthar, 1993). Embora existam estudos sobre a temática, ainda, faltam modelos teóricos e empíricos sobre a gratidão das populações que vivem em condições adversas.
É urgente repensar e avaliar a emergência da gratidão em contextos de adversidade, bem como identificar estratégias que promovam o cultivo das emoções positivas nessas situações.
Fonte: Paludo, Simone dos Santos; Koller, Silvia Helena. Gratidão em contextos de risco: uma relação possível? Disponível em: http://repositorio.furg.br/handle/1/3276